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Habitação social em edifícios de grande porte: “Zona J” e “Pantera Cor-de-Rosa” - Teresa Madeira da

Habitação social em edifícios de grande porte: “Zona J” e “Pantera Cor-de-Rosa”[1]

Autora: Teresa Madeira da Silva (ISCTE-IUL/DINÂMIA’CET-IUL)

Os dois conjuntos urbanos, conhecidos por “Zona J” e “Pantera Cor-de-Rosa”, situados em Marvila (Chelas), na cidade de Lisboa, foram construídos após a revolução de Abril de 1974 com o intuito de alojar principalmente a população que vivia em barracas e retornados das ex-colónias. A construção da maioria destes bairros correspondeu à resposta necessária, ou seja, a um problema quantitativo: o défice de habitação. Decorridos cerca de 40 anos desde a sua construção, os dois bairros apresentam, consideráveis níveis de deterioração, demonstrando indícios de inadequabilidade e proporcionando uma fraca qualidade de vida urbana, fruto de vandalizações constantes e, sobretudo, da ausência de manutenção do próprio edificado.

Sendo edifícios de grande porte, os lotes, na maioria dos casos, têm dependências comuns que obrigam à partilha dos mesmos acessos (escadas e elevadores), não existindo uma hierarquia definida entre espaços públicos, semi-públicos, privados, conduzindo à existência de espaços anónimos ou impessoais. Esta realidade, associada às dificuldades na relação entre o edifício e os espaços urbanos diretamente adjacentes ao nível do piso térreo e ao facto de existirem diferentes interesses entre as entidades envolvidas na gestão dos edifícios (moradores, IHRU, proprietários privados, associações de moradores, etc.) torna alguns lotes ingovernáveis.

No estudo que realizamos[2] depois da concretização de um diagnóstico, criamos cenários de intervenção para uma possível reabilitação: o cenário A – “manter a situação existente”, o cenário B – “reparações”, o cenário C – “intervenção”, e o cenário D – “nova Chelas”. Se, por um lado, pretendíamos respostas concretas e objetivas, por outro, também foi nossa intensão proporcionar um número variado de possibilidades de intervenção de acordo com o interesse e as características específicas de cada lote. Assim, os cenários B e C (os mais exequíveis) foram construídos a partir de uma série de linhas de atuação combináveis e reorganizáveis, onde as diversas ações se contabilizam individualmente de modo a se puderem realizar através de diversas conjugações possíveis. Estes permitem organizar dados, prever soluções, definir custos e antever benefícios de acordo com o interesse dos promotores, o que, de acordo com as rápidas mudanças na sociedade, parece ter alguma importância. O cenário C apelidado de “intervenção”, foi, do nosso ponto de vista, a resposta que encontramos para a resolução de muitos dos problemas e passa pela aproximação dos conjuntos edificados à forma de funcionamento da cidade convencional através da separação dos lotes por via da criação de acessos verticais por lote. Este cenário, cuja implantação tem como principal objetivo criar as condições para o funcionamento do edificado lote a lote através da segmentação das áreas comuns, resulta numa melhoria da qualidade da construção, da produtividade e da gestão de todo o conjunto. Esta operação tem como funções essenciais, organizar os limites administrativos dos edifícios, reduzir a dimensão dos impasses e percursos de fuga, facilitar a vigilância, a segurança e a gestão dos lotes e potenciar a alienação através da privatização das frações.

Este cenário obrigou a alguma investigação em desenho[3]: a banda do Condado (fig.1), é caracterizada pela partilha dos elementos de circulação vertical por diferentes lotes (no caso três lotes). A sua segmentação, possibilita um funcionamento mais próximo do padrão da cidade convencional, está condicionada à criação de acessos verticais por lote, assim como, à substituição de redes (organizadas também por lote), à reparação das áreas comuns de circulação e à demolição da circulação vertical existente, devendo também ser considerada a instalação de sistemas de combate a incêndio.


Fig. 1 - Esquema gráfico para a tipologia funcional: banda do Condado, Zona J.


No caso dos Lóios, (fig.2), a sistematização de soluções torna-se mais complexa dada a singularidade dos edifícios estudados. Foi, a título de exemplo, considerado o estudo da banda dos Lóios correspondente à rua ajardinada do conjunto da “Pantera Cor-de-Rosa”. Neste, a segmentação lote a lote encontra-se bastante condicionada pela forma do conjunto. Em ambos os casos, a criação de acessos verticais por lote tem a dupla função de organizar os limites administrativos e reduzir a dimensão dos impasses e percursos de fuga.


Fig. 2: Esquema gráfico para a tipologia funcional: Tipologia funcional: banda dos Lóios.


Do que pudemos observar e analisar, concluímos que na sua actual forma os edifícios são “ingovernáveis” e como se suspeitou logo no início do Estudo, a forma do edificado e o modo como os acessos se distribuem implica com o modo como os moradores vivem e usufruem o espaço, apesar das suas qualidades espaciais. Esta situação decorre da deficiente definição dos limites dos lotes, partilha e continuidade dos espaços de circulação entre lotes e da partilha de circulações verticais com situações de impasse de largas dezenas de metros, facilitando processos de apropriação ilegal dos espaços comuns. A resposta para a resolução de muitos dos problemas encontrados, como referimos, passa pela aproximação dos conjuntos edificados à forma de funcionamento da cidade convencional através a criação de acessos verticais por lote. Esta operação tem como funções essenciais, organizar os limites administrativos dos conjuntos, reduzir a dimensão dos impasses e percursos de fuga, facilitar a vigilância, a segurança e a gestão dos lotes e potenciar a alienação através da possibilidade de privatização das frações. Esta última tarefa facilitaria a futura venda das frações, potenciando maior encaixe financeiro decorrente da venda, para além dos benefícios advindos do “mix social” mais heterogéneo de moradores nos bairros.


Bibliografia:

MADEIRA da SILVA, Teresa; ALVES, Pedro Marques; MAGALHÃES Miguel Vasconcelos; OLIVEIRA, M. João (2011). Edifícios de Habitação Social: Diagnóstico e Cenários de Intervenção. CIDADES, Comunidades e Territórios, n.22, pp. 82-98. (ISSN: 2182-3030).

- MADEIRA da SILVA, Teresa; ALVES, Pedro Marques; MAGALHÃES Miguel Vasconcelos; OLIVEIRA, M. João (2013). Organização do Espaço em Edifícios de Habitação Social: Conflitualidade e Insegurança Urbana. (CORDEIRO, G. I. SANTOS, S. CARMO, R. editores) SICYURB Vol. VII. Public Sociability and Spatial Forms. Proceedings of the Second International Conference of Young Urban Recherchers (7 volumes). Lisboa: ISCTE-IUL., p.3-19. (ISBN: 978-989-732-152-8).

- MADEIRA da SILVA, Teresa (2013). Planeamento e Habitação: Habitação Social em Edifícios de Grande Porte: “Zona J” e “Pantera Cor-de-Rosa”. Atas do Seminário Área Metropolitana de Lisboa Ambiente Urbano e Riscos. Lisboa: Área Metropolitana de Lisboa. p.154-160. (ISBN: 978-972-8759-09-4).

[1] Este texto decorrer de artigos já anteriormente publicados realizados em equipa e referenciados na bibliografia.

[2] Estudo de Avaliação e Diagnóstico das Necessidades de Intervenção em dois Bairros Sociais (a “Zona J” e a “Pantera Cor-de-rosa”), situados em Marvila (Chelas), na cidade de Lisboa, realizado por uma equipa do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, para o IHRU (Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana) Equipa: Arquitectura: Teresa Madeira da Silva, Pedro Marques Alves, Miguel Vasconcelos Magalhães, Maria João Oliveira. Colaborador: Samuel Dias. Consultores: Pedro Viana Botelho e Pedro Mendes. Fundações e Estruturas: Fernando Rodrigues. Gestão Energética: Vasco Moreira Rato. Redes e Segurança Integrada: Joaquim Nogueira. Economia, Gestão Urbana e Gestão do Património: Pedro Costa. Coordenação: Teresa Madeira da Silva.

[3] Os esquemas gráficos apresentados não são proposta de projeto para os edifícios em causa, mas antes, esquemas desenhados que sugerem soluções funcionais passíveis de serem trabalhadas pelos projetistas.

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